A relação entre a terapia da fala e a música tem alcançado resultados muito promissores no trabalho com crianças com autismo.
A musicoterapia tem-se revelado uma “terapia” extremamente eficiente nos contextos terapêutico e educacional, assim como nas relações sociais e familiares.
Através da abordagem musical, pode proporcionar-se àqueles que apresentam graves limitações de comunicação uma “experiência primária de intercomunicação”, uma comunhão profunda, com o outro e introspectivamente (North, 2014).
Mas, afinal, o que é a Musicoterapia?
Segundo a Federação Mundial de Musicoterapia (WFMT): “[a] musicoterapia é a utilização da música e/ou de seus elementos (som, ritmo, melodia e harmonia), por um musicoterapeuta qualificado (graduação), com um cliente ou grupo, num processo sistematizado de forma a facilitar e promover a comunicação, o relacionamento, a aprendizagem, a mobilização, a expressão, a organização de processos psíquicos e outros objetivos terapêuticos relevantes, no sentido de alcançar necessidades físicas, emocionais, mentais, sociais e cognitivas de um ou mais indivíduos para que ele(s) recupere(m) as suas funções, desenvolva(m) o seu potencial e adquira(m) melhor qualidade de vida.
A musicoterapia procura desenvolver potenciais e/ou restabelecer funções do individuo para que este alcance uma melhor organização/integração intra e/ou interpessoal e, consequentemente, uma melhor qualidade de vida, através da prevenção, reabilitação ou tratamento.”
Como é que a música melhora a comunicação de uma criança com autismo?
De acordo com o Professor Gustavo Schulz Gattino (2015), as pessoas com autismo mostram respostas neurofisiológicas reduzidas para estímulos a partir de palavras nas regiões frontais do cérebro. Adicionalmente, entre as pessoas com autismo, podem ocorrer reduções nos níveis de actividade do córtex auditivo secundário, sendo esta a área do cérebro onde deveriam ser processados os sons da fala. Simplificando: Está cientificamente validado que, em muitos casos, os indivíduos com autismo revelam uma maior propensão pelos sons musicais do que pela comunicação por palavras.
Sendo a fala essencialmente controlada pelo hemisfério esquerdo do cérebro, enquanto a música é normalmente processada por ambos os hemisférios, estamos perante uma oportunidade para o cérebro processar a entrada de palavras através da música.
A música: (1) ajuda a unir áreas do cérebro; (2) reforça o fluxo de palavras e frases; (3) envolve movimento, o que contribui para uma melhoria na expressividade; e, em muitos casos, tem, também, (4) o benefício adicional de ajudar a acalmar e relaxar a criança.
De acordo com a Associação Americana de Musicoterapia, a música potencia a melhoria da atenção, comunicação e socialização das crianças com autismo.
A terapia da fala e a musicoterapia podem trabalhar em conjunto?
Apesar de ainda não existirem estudos científicos que comprovem os benefícios da co-aplicação de musicoterapia e terapia da fala, reconhece-se que muitos dos objetivos em crianças com autismo são comuns, podendo, essa combinação, ultrapassar barreiras de comunicação, mas não só.
A música e a linguagem partilham diversas propriedades essenciais, especialmente no que diz respeito à prosódia (entoação que se dá à fala).
A aquisição de determinadas competências comunicativas (atenção conjunta, pedir, chamar alguém, cumprimentar, escolher, comentar ou protestar) envolve capacidades similares às da percepção musical e alguns investigadores concluem que esta pode ser uma das perspetivas da utilização da música em contexto terapêutico (Sallat & Jentschke, 2015; Sim-Sim, 1998).
Do ponto de vista do desenvolvimento, a sequência das funções comunicativas traduz-se por várias etapas, iniciando-se por comportamentos não intencionais até chegar ao uso intencional e a uma comunicação simbólica convencional. Nas crianças com autismo as funções comunicativas encontram-se diminuídas ou ausentes, sendo a Musicoterapia uma via por excelência para estimular essas funções. O recurso à música e ao som, promove, também, comportamentos de antecipação ao tornar os acontecimentos mais previsíveis e, assim, permitir o desenvolvimento da auto-regulação, o que auxilia a criança com autismo a ultrapassar barreiras comportamentais que, muitas vezes, a podem inibir de progredir noutras áreas do desenvolvimento.
Para além do supra-citado, a revisão de literatura demonstra uma grande variedade de actividades, que podem ser melhoradas através da música, nomeadamente:
– Encorajar o desejo de comunicar;
– Melhorar o comportamento recíproco;
– Reduzir comportamentos estereotipados;
– Promover melhores relações quer a nível emocional quer social;
– Promover a atenção conjunta;
– Reduzir comportamentos não comunicativos;
– Tornar possível a auto-expressão;
– Eliminar comportamentos de ecolália (repetição automática de palavras ou sons ouvidos).
Em jeito de conclusão: a história de Benji
Aos 18 meses, os pais aperceberam-se que a aquisição de competências linguísticas de Benji estava a regredir. Aos dois anos e meio, foi-lhe foi diagnosticada uma perturbação do espetro do autismo e os desafios para a família tornaram-se mais claros. Com a ajuda de musicoterapia, Benji foi adquirindo as competências que lhe permitiriam ingressar na escola com a necessária preparação para a aprendizagem de leitura e da escrita. Acompanhe a história de como a musicoterapia ajudou o Benji neste --> vídeo (em Inglês, mas, após esta introdução, torna-se totalmente perceptível).
Por último, e para uma melhor compreensão do que consiste a perturbação do espetro do autismo aconselhamos este --> vídeo (em Inglês).
Um Feliz Dia Mundial da Consciencialização do Autismo para todos!
Lígia Pinto, Terapeuta da Fala / SpeechCare
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