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Foto do escritorGonçalo Carvalheda

Como ajudar o seu filho a comunicar melhor? Um guia para o dia-a-dia dos pais





Até à entrada no 1º ano de escolaridade, uma criança atravessa um percurso crucial de aquisição de competências linguísticas e comunicativas, que pode e deve ser estimulado pela família.


As crianças comunicam desde o nascimento. Através do choro, do sorriso, do olhar ou das vocalizações. E é desde esse primeiro momento que nós, os adultos, procuramos decifrar essa comunicação não verbal e responder às suas necessidades.


Na interacção comunicativa com os adultos, a criança começa a interessar-se pelo mundo que a rodeia e a descobrir a influência do seu comportamento nos outros. Gradualmente, vai desenvolvendo a sua linguagem e começa a compreender o que lhe é dito, que se transformará, mais tarde, em sílabas, palavras e frases.



A linguagem é um processo complexo e dinâmico, que envolve:


- Os sons e as suas combinações (fonologia),

- A formação e a estrutura das palavras (morfologia), - A organização das palavras em frases (sintaxe), - O conteúdo informativo, significado e interpretação das combinações de palavras (semântica); - As regras do uso da linguagem e a adequação ao contexto situacional e social (pragmática).



Diferenças entre comunicação, linguagem e fala


A comunicação é a forma mais ampla de transmitirmos mensagens e emoções. Nela, cabe a linguagem (descrita no parágrafo a cima) e a fala (o acto motor, que envolve a coordenação neuromuscular). Até à entrada no 1º ano de escolaridade, uma criança atravessa um percurso crucial de aquisição de competências linguísticas e comunicativas, que pode e deve ser estimulado pela família.


Nas sessões de terapia da fala, são muitos os pais preocupados com o aparente atraso no desenvolvimento linguístico dos filhos. Comparam-nos com outras crianças e estranham o atraso na fala, o vocabulário reduzido ou a aparente dificuldade em aprender mais.


Após a avaliação terapêutica, que é necessariamente individual, sugerimos a todos os pais que integrem estratégias simples de estimulação da comunicação e da linguagem nas rotinas familiares:


- No dia-a-dia habitue-se a descrever o que faz ou vai fazer, o que vê, o que cheira ou o que sente, promovendo a escolha da criança: “Queres o copo azul ou o amarelo? Queres a maçã ou banana? Vamos brincar com o avião ou com o carro?”;


- Durante a conversação, devolva à criança, de forma correcta, as palavras mal pronunciadas e /ou “abebezadas”;


- Desenvolva o jogo simbólico “o faz de conta” (brincar às casinhas, ao médico, a ida ao supermercado…). Personifique um bombeiro, um enfermeiro, um vendedor e exemplifique a suas funções;


- Escolha um item que esteja no espaço à sua volta e descreva-o utilizando várias características até a criança adivinhar (ex.: Eu vejo… um brinquedo, redondo, preto e branco que serve para chutar);


- Joguem o jogo do “Dá-me cinco”: peça à criança que diga cinco itens de uma categoria semântica à escolha (ex: vestuário; frutas, instrumentos musicais);


- Realizem jogos para estimular a expansão frásica “A Joana vai ao supermercado…” pedir à criança para dar continuidade à frase;


- Poderá fazer o jogo em que a criança é o professor, diga frases gramaticalmente incorretas e a criança terá que reconhecer o erro e, posteriormente, corrigir (por exemplo: “Eu comi duas cenoura”; “Amanhã fui à praia”; “A menina bebe a maçã”; “A Joana é minha irmão”).



Com o 1º ciclo chegam os desafios da leitura e da escrita


Ao terminar o jardim-de-infância, uma criança já deve possuir alguns pré-requisitos fundamentais para a aquisição da linguagem escrita. Um deles é a consciência fonológica, ou seja, a capacidade de identificar e dizer rimas e de dividir frases em palavras e estas em sílabas, de manipular sílabas ou de identificar os sons nas palavras.



Estímulo da consciência fonológica em crianças de 4-5 anos:


- Realização de jogos com rimas: - Divisão das frases em palavras; - Contabilização do número de palavras que compõem uma frase; - Divisão das palavras em sílabas; - Descobrir quais são as palavras mais curtas e as mais compridas; - Descobrir o que acontece com a palavra /cebola/ quando tiramos a sílaba /ce/ - O que acontece quando acrescentamos o /a/ antes de /braço/; - Dizer palavras pela sílaba inicial; - Dizer palavras começadas por determinados sons (por exemplo, /ssss/).



A aprendizagem da leitura e da escrita não é um processo natural e espontâneo como a aquisição da fala. É uma aprendizagem que envolve competências linguísticas, cognitivas, psicomotoras, entre outras, cruciais para o sucesso académico. Pode e deve utilizar algumas das estratégias abaixo para estimular a leitura e a escrita do seu filho:


- Pedir à criança para ler a lista de compras e identificar os produtos no supermercado;


- Promover a correção dos erros de escrita através da segmentação silábica e fonémica ao invés da clássica escrita do erro várias vezes (ex.: <banana> - ba/na/na (silábica) – b/a/n/a/n/a) (fonémica);


- Jogue ao jogo do “STOP” com categorias apropriadas à idade da criança;


- Incentive a criança a pequenas tarefas de escrita integradas nas rotinas diárias, como escrever bilhetes ou recados para a família;


- Incentive a escrita através da banda desenhada;


- Promova atividades de escrita utilizando o computador, isto ajudará a criança a soletrar as palavras;


- Aproveite a hora da preparação da refeição para pedir à criança que leia a

receita do almoço ou jantar.



O carácter cumulativo da aprendizagem


No próximo ano lectivo, numa parceria com o Instituto para o Desenvolvimento

Social (IDS), será lançada uma formação para Educadores e Professores, com o

objectivo de reforçar as competências de estimulação de comunicação e linguagem

em contexto primário e pré-primário.


Os profissionais educativos são fundamentais na detectação e atendimento das dificuldades das crianças e na transmissão de informação rigorosa e útil aos pais, um trabalho ainda mais necessário após longos meses de confinamento.


As crianças têm o seu próprio ritmo e preferências e é natural que algumas

demorem mais tempo a falar correctamente. No entanto, a aprendizagem tem um

carácter cumulativo e fechar os olhos quando a criança demonstra dificuldades

inabituais para a idade não a vai ajudar.


Pelo contrário, provavelmente agravará os problemas na etapa seguinte e assim sucessivamente.


Na dúvida, consulte um terapeuta da fala. As estratégias referidas devem ser promovidas com todas as crianças, de forma rotineira, instrutiva e divertida, durante a passagem pelo jardim-de-infância e nos primeiros anos de ensino primário.



Nicole Agrela


Terapeuta da Fala e Coordenadora do SpeechCare Schools, Doutorada em Ciências
da Cognição e da Linguagem pela Universidade Católica Portuguesa

(Artigo publicado a 5 de Julho de 2021, na edição online do jornal Público)



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